O COBRADOR DA ÁGUA
O COBRADOR DA ÁGUA
Manhã modorrenta de uma quinta-feira de um de mês bissexto, estando o tempo mais para uma boa soneca do que para uma leve e despretensiosa atividade .
A tarde chuvosa corria vagarosamente, com grossos pingos, mas nada para assustar.
Alguém toca a campainha de casa, perguntei pelo interfone quem era.
- Cobrador da água...
- Quando obtive essa resposta, sabia de antemão que não era a cobrança da água da rua que, há muitos anos, é liquidada em débito automático em uma agência bancária.
- Quanto é? Perguntei-lhe.
- Duzentos e trinta reais e cinquenta centavos...
Preenchi um cheque nesse valor, falando para o cobrador, agora pela janela da porta, que seria aberto o portão automático para a entrega do documento bancário.
Aberto o portão, como eu estava descalço, o cobrador adentrou a varanda para o recebimento.
Entreguei a ele o cheque e, mesmo sem conferi-lo, guardou-o na algibeira de um cinturão que trazia preso na cintura.
Ele viera fazer a cobrança em uma motocicleta , saltando nela, lépido, mesmo ainda chovendo, acomodou-se no banco molhado do veículo, saindo á toda velocidade em busca dos pagamentos de outros clientes.
Recordei-me que no passado não se vendiam botijões de água mineral, de casa em casa.
Utilizava-se uma talha de barro composta de duas peças, a superior possuía as velas responsáveis pela filtragem.
A água, agora já filtrada, gotejava lentamente para o reservatório inferior que a conservava fresca e pura, pronta para o consumo
Geladeiras, nem pensar, estavam bem distantes do poder de compra de quase toda a população.
Lembrei-me, a seguir, do padeiro, do leiteiro e do bucheiro daqueles tempos, todos incumbidos da entrega dos seus produtos, de casa em casa.
O padeiro, com sua charrete de pneus, chegava primeiro, buzinando a não mais valer pelas ruas desertas da madrugada, deixando os sacos com pães dependurados nos portões.
O leiteiro, chegando em seguida, com sua condução também estrepitosa, fazendo valer a sua buzina, deixando as garrafa em locais previamente combinados com os clientes.
Em derradeiro, somente no final da semana, por volta de dez horas da manhã, ouvia-se mais um costumeiro vendedor com seu carrinho, a gritar pelas ruas:
- Bucheiro...Bucheiro..., fazendo soar o seu barulhento berrante.
As donas de casa saiam na rua para comprar dele miúdos de vaca e de porco, tais como fígados, línguas, corações, buchos, rabadas e rins.
Depois de atender a frequesia daquela rua, continuava a sua viagem pela cidade, fazendo um grande barulho com o seu carrinho, continuando a gritar a plenos pulmões:
- Bucheiro...Bucheiro...
JARBAS MIGUEL TORTORELLO
FEVEREIRO DE 2016