O VÉIO DO SACO
Em Gonzaga de Campos, hoje um bairro de São José do Rio Preto, caminhando pelo leito da ferrovia, passava ali, de tempo em tempo, um velho com espessas barbas brancas, que tinha o saco escrotal longo, bem acima da média.
Empunhando um cajado e vestido com um roupão claro que ia até os seus pés, calçava sempre rôtas sandálias, aceitando aqui e ali um prato de comida ou um lanche.
As crianças o chamavam de “bruxo”, embora não soubessem pelo menos o que seria bruxaria, ou também de “véio do saco” em virtude da anomalia que possuía em seu órgão genital, visível até pelo volume sob o seu roupão.
O ancião, que tinha ar messiânico, em represália, xingava os moleques com nomes impublicáveis, mas não tinha condições de correr atrás deles.
Depois de alimentado pelas boas almas que habitavam o lugarejo, daí dois ou três dias, apanhava a sua trouxa de roupas, colocando-a sob às costas, continuando a sua caminhada pelo leito da ferrovia em direção à Mirassol, estação mais próxima.
O trecho completo que fazia a pé com cinquenta quilometros mais ou menos, era entre Cedral e Bálsamo, passando por Engenheiro Schmidt, Rio Preto, Gonzaga de Campos e Mirassol, calculando-se o tempo pelas demoras em suas viagens de idas e de voltas.
Mas, de repente, deixou de caminhar por aquele trecho ferroviário, ninguém sabendo dar noticias a respeito dele.
As crianças sempre perguntavam por ele, mas o seu paradeiro passou a ser totalmente desconhecido.
Em todos os locais em que passara era bem lembrado, uma vez que tinha o hábito de pedir uma caneca com água para benzê-la.
Durante essa benção, ele rezava um Pai Nosso e, com um galhinho de arruda, fazia o sinal da cruz.
Afirmava que aquela água, depois de benta, curava todos os males e doenças, devendo ser sorvida em pequenas doses.
O “bruxo” ou o “véio do saco”, pelas suas esquisitices, pelos seus trajes incomuns e pelo aleijão que apresentava em seu órgão, ficou marcado, não só como curandeiro, mas também como figura folclórica naquela região riopretense.
JARBAS MIGUEL TORTORELLO